Page 55 - Da Terra
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Houve um tempo que em Portugal se viveu um período de grandes dificuldades
económicas com escassez de bens alimentares, que passaram a ser racionados por
senhas. Cada família nha direito a umas quantas senhas que depois eram trocadas
por um quilo de pão, um quilo de farinha, 250gr de açúcar, azeite, entre outros
produtos, levantados em locais es pulados pelo governo.
Contrapeso todos. Então, era preciso sair de madrugada e esperar em longas filas para obter algo
Ter acesso às senhas não era garan a de que houvesse produtos suficientes para
para comer.
Foi o que aconteceu ao Julinho. Saiu de casa ainda o sol não nha nascido com a
missão de trazer pão para a família. A fome apertava no estômago, mas o Julinho não
reclamava. Ficou na longa fila para o pão, vendo o sol nascer.
Quando chegou a sua vez, o padeiro colocou no seu saco de pano, um pão preto,
muito escuro. "Mais preto que um forro de um barreto", pensou o Julinho. A
escassez de farinha era tanta que a mesma quase não era peneirada para dar para
mais, ficando cheia de impurezas e cascas que lhe davam um aspeto sujo e escuro.
O pão era a peso e o padeiro, ao separar a massa, dificilmente conseguia calcular o
peso certo depois de cozido. Então, para acertar o peso, por vezes, acrescentava um
bocado ou uma fa a de outro pão, para perfazer o peso certo.
Chamavam a isso Contrapeso.
Pois o Julinho viu o padeiro colocar duas fa as de pão dentro do seu saco. Saiu da
padaria e pôs-se a caminho de casa. O cheiro do pão torturava-o. E a fome. O Julinho
não aguentou e comeu uma fa a de pão. Afinal o Contrapeso nem sempre era dado
e a mãe não nha uma balança para saber o peso do pão. Aquela fa a de pão soube-
lhe divinalmente. Mas soube-lhe a pouco. E logo comeu também a outra.
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